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Princípios básicos para cuidar de si mesmo

Não se deixe levar por qualquer vento

Devagar e sempre.
Slogan do programa dos Doze Passos


Eu sou uma reacionária.
Um dia, em meu escritório, esse pensamento iluminou-se intensamente em minha consciência. Já havia visto pessoas discutirem sobre reações, mas até aquele momento não compreendia o quanto eu reagia.
Eu reagia a emoções, comportamentos, problemas e pensamentos de outras pessoas. Reagia ao que elas talvez estivessem sentindo, pensando ou fazendo. Reagia a meus pensamentos, problemas e emoções. Meu ponto forte parecia ser reagir a crises – e achava que quase tudo era crise. Eu reagia demais. O pânico oculto (que beirava a histeria) fervia dentro de mim a maior parte do tempo. Às vezes, eu reagia de menos. Se o problema era muito grande eu quase sempre usava a arma da negação. Reagia a quase tudo que aparecesse em minha consciência e meu ambiente. Minha vida inteira tinha sido uma reação às vidas, aos desejos, aos problemas, aos fracassos, aos sucessos e às personalidades de outras pessoas. Até minha baixa autoestima, que carregava comigo como um saco de lixo imundo, era uma reação. Eu era como uma marionete, com as cordas penduradas, convidando e permitindo a qualquer um que as manobrasse.

A maioria dos codependentes é reacionária. Reagimos com raiva, culpa, vergonha, ódio de nós mesmos, preocupação, mágoa, gestos controladores, cuidado, depressão, desespero e fúria. Reagimos com medo e ansiedade. Alguns de nós reagimos tanto que chega a ser doloroso estar perto de alguém, e torturante estar em grandes grupos de pessoas. É normal reagir e responder ao nosso ambiente. Reagir faz parte da vida. Faz parte de interagir, de estarmos vivos e sermos humanos. Mas nos permitimos ficar aborrecidos demais, distraídos demais. Coisas pequenas, coisas grandes – qualquer coisa – têm o poder de tirar-nos dos trilhos. E a maneira que ficamos depois que reagimos geralmente não é boa para nós.

Podemos ter começado reagindo e contestando rápida e compulsivamente de maneira a nos ferir. Apenas sentir rápida e compulsivamente já é o bastante para nos ferir. Mantemo-nos sempre em estado de crise – a adrenalina flui e os músculos se retesam, prontos para reagir a emergências que geralmente não são emergências. Se alguém faz algo, devemos fazer algo de volta. Se alguém diz algo, precisamos dizer algo de volta. Se alguém se sente de certa maneira, precisamos sentir-nos de certa maneira. SALTAMOS SOBRE A PRIMEIRA SENSAÇÃO QUE DESPONTA EM NOSSO CAMINHO E DEPOIS MERGULHAMOS NELA. Pensamos a primeira coisa que nos vem à mente e depois ficamos a elaborá-la. Dizemos as primeiras palavras que se formam em nossa língua e às vezes nos arrependemos. Fazemos a primeira coisa que nos vem à cabeça, geralmente sem pensar. Esse é o problema: reagimos sem pensar honestamente sobre o que precisamos fazer e como queremos lidar com a situação.

Nossas emoções e nosso comportamento estão sendo controlados – e disparados – por todos e tudo à nossa volta. Estamos permitindo indiretamente que os outros nos digam o que fazer. Isso significa que perdemos o controle. Estamos sendo controlados.

Quando reagimos, abrimos mão de nosso poder pessoal, dado por Deus, de pensar, de sentir, de nos comportar em nosso melhor interesse. Permitimos que outros determinem quando ficaremos felizes; quando ficaremos em paz; quando nos aborreceremos; o que diremos, faremos, pensaremos e sentiremos. Abrimos mão de nosso direito de nos sentir em paz em nossos ambientes. Ficamos como uma folha numa tempestade: ao sabor de qualquer vento.

Aqui está um dos muitos exemplos de como eu costumo reagir: eu trabalho em casa e tenho dois filhos pequenos. Quando estou trabalhando em meu escritório, eles às vezes começam a gritar em outros cômodos da casa – lutam, correm, fazem bagunça, comem e bebem tudo que há na cozinha. Minha primeira e instintiva reação é gritar: “Parem com isso!”
Minha segunda reação é gritar mais ainda. Isso acontece naturalmente. Reagir assim parece ser mais fácil do que sair do escritório, passar pela cozinha e ir lá em cima. Também parece mais fácil do que parar para pensar como desejo controlar essa situação. O problema é que gritar e berrar não funciona. Não é realmente mais fácil. Faz a garganta doer e ensina às
crianças como me manter sentada e berrando em meu escritório.

Reagir geralmente não funciona. Reagimos rápido demais, com intensidade e pressa demais. Nesse estado de espírito, raramente podemos fazer nosso melhor quanto a qualquer coisa. A ironia é que não temos de fazer nada nesse estado de espírito. Há poucas coisas em nossa vida que não possamos fazer melhor quando estamos calmos. Pouquíssimas situações – não importa o quanto pareçam exigir – podem ser melhoradas quando ficamos frenéticos. Por que então fazemos isso?

Reagimos porque estamos ansiosos e com medo do que aconteceu, do que pode acontecer e do que está acontecendo. Muitos de nós reagimos como se tudo fosse uma crise, porque convivemos com tantas crises durante tanto tempo que essa reação se tornou um hábito.
Reagimos porque achamos que as coisas não deviam estar acontecendo da forma como estão.
Reagimos porque não nos sentimos bem quanto a nós mesmos.
Reagimos porque a maioria das pessoas reage.
Reagimos porque achamos que devemos.
Não temos de reagir.
Não precisamos ter tanto medo das pessoas. Elas são apenas pessoas como nós.
Não temos de abrir mão de nossa paz. Isso não ajuda nada. Os mesmos fatos e os mesmos recursos estarão disponíveis se estivermos em paz ou neuróticos e desesperados. Na realidade, temos mais recursos disponíveis quando nossas mentes e nossas emoções estão livres para funcionar num nível mais alto.

Não temos de abrir mão de nosso poder de pensar e sentir por ninguém ou por nada. Isso também não é necessário. Não temos de levar as coisas tão a sério (a nós mesmos, aos acontecimentos e a outras pessoas). Colocamos tudo fora de proporção – nossos sentimentos, pensamentos, ações e erros. Fazemos o mesmo com os sentimentos, pensamentos e ações de outras pessoas. Dizemos a nós mesmos que as coisas são horríveis, terríveis, uma tragédia – o fim do mundo. Muitas coisas podem ser tristes, lastimáveis e desagradáveis, mas a única que é o fim do mundo é o fim do mundo. As emoções são importantes, mas são apenas emoções. Pensamentos são importantes, mas são apenas pensamentos – e todos nós pensamos de formas diferentes, e nossos pensamentos estão sujeitos a mudanças. O que podemos dizer e fazer é importante, o que os outros dizem e fazem é importante, mas o mundo não depende de nenhum discurso ou de nenhuma ação especial. Se for particularmente importante que alguma coisa seja feita ou dita, não se preocupe, isso acontecerá. Anime-se. Dê a si e aos outros espaço para se movimentar, para fazer, para ser quem são – para ser humanos. Dê à vida chance de acontecer. Dê a si mesmo a oportunidade de desfrutar disso.

Não temos de considerar o comportamento de outras pessoas como reflexos de nosso valor próprio. Não temos de nos envergonhar se alguém que amamos escolhe comportar-se indevidamente. É normal reagir dessa forma, mas não temos de continuar a nos sentir envergonhados e inferiores se esse alguém continuar a se comportar impropriamente. Cada pessoa é responsável por seu próprio comportamento. Se alguém se comportar mal, deixe que se envergonhe por si mesmo. Se você não fez nada para se sentir envergonhado, não se sinta envergonhado. Sei que é difícil, mas pode ser feito.

Não temos de considerar a rejeição como um reflexo de nosso valor próprio. Se alguém que você julga importante (ou mesmo não tão importante) rejeita você ou suas escolhas, você ainda existe, e é tão importante quanto antes de ser rejeitado. Sinta as emoções que acompanham a rejeição; converse sobre seus pensamentos, mas não abra mão do amor-próprio, de quem você é ou do que tenha feito devido a uma desaprovação ou rejeição por parte de alguém. Mesmo se a pessoa mais importante do mundo o rejeitar, continue a existir e continue bem. Se fez algo errado, precisa resolver algum problema ou mudar seu comportamento, então tome as medidas apropriadas para cuidar de si mesmo. Mas não se rejeite e não dê tanto poder à rejeição de outras pessoas. Isso não é necessário.

Não temos de levar tudo para o lado pessoal. Levamos a sério coisas que não deveríamos. Por exemplo, dizer “se você me amasse, você não beberia” a um alcoólico faz tanto sentido quanto dizer “se você me amasse, você não tossiria” a alguém com pneumonia. As vítimas de pneumonia tossirão até conseguirem curar-se da doença. Os alcoólicos beberão até que o mesmo aconteça. Quando as pessoas com algum distúrbio compulsivo fazem o que são compelidas a fazer, elas não estão dizendo que não amam você – estão dizendo que não amam a si mesmas.

Não temos, tampouco, de tomar as pequenas coisas como afrontas pessoais. Se alguém tem um dia ruim ou fica com raiva, não assuma logo que isso tenha algo a ver com você. Talvez tenha – ou não tenha. Se tiver, você logo descobrirá. Em geral, tudo tem muito menos a ver conosco do que pensamos.

Uma interrupção, o mau humor de alguém, palavras ásperas, um dia ruim, pensamentos negativos, problemas ou alcoolismo ativo não devem controlar ou arruinar nossa vida, nosso dia, nem mesmo uma horinha dele. Se as pessoas não querem estar conosco ou agir saudavelmente, isso não é um reflexo de nosso valor próprio. É apenas um reflexo de como elas se sentem naquele momento. Praticando o desligamento, podemos reduzir nossas reações destrutivas ao mundo a nossa volta. Separe a si próprio de tudo. Fique em paz, deixe as pessoas serem quem são. Quem é você para dizer que uma interrupção, um mau humor, uma palavra, um dia ruim, um pensamento ou um problema não são parte importante e necessária da vida? Quem é você para saber se, no fim das contas, esse problema não poderá ser benéfico para você ou para alguém? Não temos de reagir. Temos nossas opções. Essa é a alegria da recuperação da codependência. E cada vez que exercitamos nosso direito de escolher como desejamos agir, pensar, sentir e nos comportar, nos sentimos melhor e mais fortes.

“Mas”, você poderia protestar, “por que eu não reagiria? Por que não deveria dizer nada de volta? Por que não deveria estar aborrecido? Ele ou ela merece o tranco da minha reação.” Pode ser, mas você, não. Estamos falando aqui sobre sua falta de paz, sua falta de serenidade, de seus momentos desperdiçados. Como Ralph Edwards costumava dizer: “Esta é a sua vida.”
Como quer vivê-la? Você não estará desligando-se por ele ou por ela. Estará desligando-se por você mesmo. E é bem provável que todos se beneficiem com isso.

Somos como cantores num grande coro. Se o sujeito ao nosso lado desafinar, devemos desafinar também? Não ajudaria mais, a ele e a nós, tentarmos continuar afinados? Podemos aprender a fazer a nossa parte. Não precisamos eliminar todas as reações às pessoas e aos problemas. As reações podem ser úteis. Ajudam-nos a identificar o que gostamos e o que nos faz sentir bem. Ajudam-nos a identificar problemas dentro e volta à nossa. Mas a maioria de nós reage demais. Muitas das coisas às quais reagimos não passam de bobagens. Não são tão importantes assim, não merecem o tempo e a atenção que lhes damos. Uma das coisas às quais reagimos é a reação de outras pessoas a nós (estou com raiva porque ele ficou com raiva; ele ficou com raiva porque eu estava com raiva; eu fiquei com raiva porque achei que ele estivesse com raiva de mim; ele não estava com raiva, estava magoado porque…).

Nossas reações podem ser uma cadeia de reações onde frequentemente todos acabam aborrecidos e ninguém sabe por quê. Simplesmente ficam aborrecidos. Depois, cada um se descontrola e fica sendo controlado. Às vezes, as pessoas se comportam de certas maneiras para provocar certas reações nossas. Se pararmos de reagir, tiraremos toda a diversão delas. Se nos afastarmos de seu controle, retiramos seu poder sobre nós. Às vezes, nossas reações levam as pessoas a reagirem de certas formas. Assim, nós as ajudamos a justificarem determinados comportamentos (e não precisamos mais disso, precisamos?).

Reagir pode limitar tanto a nossa visão que ficamos presos em reagir a sintomas de problemas. Podemos ficar tão ocupados reagindo que nunca teremos tempo ou energia para identificar o verdadeiro problema, muito menos para descobrir como resolvê-lo.

Podemos passar anos reagindo a casos de reincidência de bebida e às crises resultantes, deixando completamente de reconhecer que o verdadeiro problema é o alcoolismo! Aprenda a parar de reagir de formas desnecessárias e que não funcionam. Elimine as reações que o magoam.

Seguem-se algumas sugestões para ajudá-lo a se desligar das pessoas e de suas reações destrutivas perante elas. São apenas sugestões. Não existe fórmula exata para o desligamento. Você precisa descobrir sua própria maneira, a que funcionará para você.

1. Aprenda a reconhecer quando está reagindo, quando está permitindo que alguém ou algo irrite você. Geralmente, quando começar a se sentir ansioso, amedrontado, indignado, irado, rejeitado, com pena de si mesmo, envergonhado, preocupado ou confuso, haverá algo irritando-o. Não estou dizendo que é errado sentir essas emoções. Provavelmente qualquer um se sente assim. A diferença é que estamos aprendendo a decidir por quanto tempo queremos deixarmo-nos dominar por elas e o que desejamos fazer a esse respeito. Usar as palavras “ele, ela ou aquilo me fez sentir” geralmente indica que estamos reagindo. Perder nossa calma e serenidade é provavelmente a maior indicação de que fomos assaltados por algum tipo de reação.

2. Fique à vontade. Quando reconhecer que está no meio de uma reação caótica, diga ou faça o menos possível até que possa voltar a seu nível de calma e serenidade. Faça o que for necessário (a intenção é não ser destrutivo) para relaxar. Respire fundo. Dê um passeio. Assista a um programa de televisão. Arrume a casa. Vá ao banheiro. Vá visitar um amigo
ou amiga. Vá a uma reunião do Al-Anon. Leia um livro. Encontre uma forma de se separar emocional, mental e (se necessário) fisicamente do motivo ou da pessoa à qual está reagindo. Encontre uma forma de acalmar sua ansiedade. Não beba ou dirija a 100 quilômetros por hora. Faça algo seguro que ajude a restaurar seu equilíbrio.

3. Examine o que aconteceu. Se for um pequeno incidente, você mesmo pode ser capaz de analisá-lo. Se o problema for sério ou estiver aborrecendo-o seriamente, talvez queira discuti-lo com amigos para ajudar a esclarecer seus pensamentos e emoções. Problemas e emoções ficam violentos quando tentamos mantê-los presos dentro de nós. Converse sobre suas emoções. Assuma a responsabilidade sobre elas. Sinta as emoções que tiver que sentir. Ninguém fez você senti-las. Alguém pode ter contribuído para que se sentisse de determinada forma, mas você sentiu tudo sozinho. Lide com isso. Enfrente isso. Depois, diga a si mesmo a verdade sobre o que aconteceu.1
Alguém estava tentando irritá-lo? (Quando estou em dúvida entre interpretar algo como um insulto ou uma rejeição, prefiro acreditar que aquilo não teve nada a ver comigo. Isso economiza meu tempo e ajuda a me sentir bem comigo mesma.) Estava tentando controlar alguém ou alguma coisa? Quão sério é o problema ou o caso? Está assumindo a
responsabilidade de alguém mais? Está com raiva porque alguém não adivinhou o que realmente queria ou estava tentando dizer? Está levando seu comportamento de forma demasiadamente pessoal? Alguém detonou sua culpa ou sua insegurança? É realmente o fim do mundo ou é apenas triste e decepcionante?

4. Descubra o que precisa fazer para cuidar de si mesmo. Tome suas decisões baseando-se na realidade, e quando estiver calmo. Precisa desculpar-se? Precisa libertar-se? Precisa ter uma conversa de coração aberto com alguém? Precisa tomar algum outro tipo de decisão para cuidar de si mesmo? Quando tomar sua decisão, tenha em mente quais são suas responsabilidades. Você não é responsável por fazer com que outras pessoas “vejam a luz” e não precisa “colocá-las na linha”. Você é responsável por ajudar a si mesmo a ver a luz e a se colocar na linha. Se não conseguir ficar calmo para tomar uma decisão, relaxe. Ainda não é hora de tomá-la. Espere até que sua mente esteja clara e suas emoções estejam calmas.
Reduza a velocidade. Não precisa ficar tão assustado. Não precisa ficar tão furioso. Mantenha as coisas em perspectiva. Torne a vida mais fácil para si mesmo.

ATIVIDADE

1. Está passando tempo demais reagindo a alguém ou a algo em seu ambiente? A quem ou a quê? Como está reagindo? É assim que se comportaria ou sentiria se tivesse escolha?

2. Reveja os passos anteriores e se desligue do que ou de quem o esteja aborrecendo. Se precisar conversar com alguém, escolha um amigo em quem confie. Se for necessário, procure ajuda profissional.

3. Que atividades o ajudam a sentir-se calmo e confortável? (Uma reunião dos Doze Passos, um banho quente, um bom filme ou dançar são as minhas favoritas.)

Do livro: Codependência Nunca Mais, Pare de Controlar os Outros e Cuide de Você Mesmo, [recurso eletrônico] Melody Beattie, 5ª Edição, Viva Livros, 2017

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