
Princípios básicos para cuidar de si mesmo
Sim, você pode pensar
Pois Deus não nos deu um espírito de timidez,
mas de fortaleza, de amor e de sabedoria.1
II Timóteo 1:7
— O que acha que devo fazer? – perguntou-me certa vez uma cliente que estava nos estertores de sua codependência. Ela estava enfrentando uma importante decisão com relação ao marido e aos filhos.
– O que você acha? – perguntei.
– Está perguntando a mim? – devolveu ela. – Levo quinze minutos na loja para decidir se prefiro comprar o sabão de 59 centavos ou o de 63. Não consigo tomar uma decisão, por menor que seja. Como espera que eu tome uma decisão importante como essa?
Como codependentes, muitos de nós não confiamos em nossa mente. Realmente compreendemos o horror da indecisão. As menores escolhas, como o que comer num restaurante ou que sabão comprar, nos paralisam. Quanto maiores as decisões que enfrentamos – como, por exemplo, resolver nossos problemas, o que fazer com nossas vidas e com quem viver – mais sobrecarregados podemos ficar. Muitos de nós simplesmente desistimos e nos recusamos a pensar nessas coisas. Alguns de nós permitimos que outras pessoas ou circunstâncias façam essas escolhas por nós.
Este capítulo é curto, mas é importante. Ao longo de todo este livro tenho encorajado você a pensar e analisar as coisas, decidir o que precisa, decidir o que deseja e decidir como resolver seus problemas. Talvez vocês estejam pensando se isso é possível. O objetivo deste capítulo é dizer-lhe que você pode pensar, pode analisar as coisas e pode tomar decisões – decisões boas e saudáveis.
Por uma série de razões, podemos ter perdido a fé em nossa capacidade de pensar e de concluir algo sobre as coisas. Acreditar em mentiras, mentir para nós mesmos (negação), o caos, a tensão, a autoestima baixa e um estômago cheio de emoções reprimidas podem toldar nossa capacidade de pensar. Ficamos confusos. Mas isso não significa que não podemos pensar.
Reagir demais pode prejudicar nosso funcionamento mental. A decisão é prejudicada pela preocupação com o que as outras pessoas podem pensar, em dizer a nós mesmos que temos de ser perfeitos, e em dizer a nós mesmos que temos de nos apressar. Acreditamos falsamente que não podemos fazer a escolha “errada”, que nunca teremos outra chance, e que o mundo inteiro aguarda e depende dessa nossa decisão. Não precisamos fazer isso connosco. Tampouco ajuda nosso processo de raciocinar odiarmos a nós mesmos, dizermos a nós mesmos que não tomaremos boas decisões e depois mergulharmos numa pilha de “deveria” cada vez que tentamos resolver algo.
Não dar ouvidos aos nossos desejos e necessidades e dizer a nós mesmos que o que desejamos é errado afasta-nos da informação de que precisamos para fazer boas escolhas. Tentar adivinhar o que vai acontecer ou imaginar o que teria acontecido “se” você tivesse tomado outra atitude também não.
Estamos aprendendo a amar, a confiar e a ouvir a nós mesmos. Talvez venhamos usando nossa mente para nos preocupar e ficar obcecados, e nossa mente está cansada, violentada e cheia de pensamentos ansiosos. Estamos aprendendo também a abandonar esses padrões.
Talvez tenhamos perdido a fé em nossa capacidade de pensar, porque nos disseram que não conseguimos pensar e tomar boas decisões. Nossos pais podem ter feito isso direta ou indiretamente quando éramos crianças. Eles podem ter dito que éramos estúpidos. Ou podem ter tomado nossas decisões por nós. Talvez tenham criticado todas as nossas escolhas. Ou poderiam ter-nos confundido, negando ou recusando-se a reconhecer nossa capacidade de pensar quando apontamos certos problemas que existiam em casa.
Talvez tivéssemos dificuldades com algumas matérias na escola, quando éramos jovens; em vez de fazer o necessário para resolver o problema, desistimos e dissemos a nós mesmos que não conseguíamos pensar.
As pessoas talvez tenham desprezado a inteligência das mulheres, mas isso é bobagem. Não somos estúpidas. As mulheres sabem pensar. As crianças sabem pensar. Podemos estar vivendo agora com pessoas que nos dizem direta ou indiretamente que não conseguimos pensar. Algumas delas podem até nos estar dizendo que somos de fato loucos, mas os alcoólicos fazem isso com as pessoas com quem vivem.
Talvez tenhamos começado a imaginar que éramos loucos! Mas nem por um minuto acredite em nada disso. Nós sabemos pensar. Nossa mente trabalha direito. Podemos analisar as coisas. Podemos tomar decisões. Podemos imaginar o que desejamos e necessitamos e qual é a hora de fazer isso. E podemos fazer escolhas que aumentem nossa autoestima. Podemos até ter opiniões! E, claro, nós as temos.
Podemos pensar apropriada e racionalmente. Podemos até ter o poder de avaliar a nós mesmos e aos nossos pensamentos, e depois corrigi-los quando eles se tornam desastrosos ou irracionais. Podemos avaliar nosso comportamento. Podemos tomar decisões sobre o que necessitamos e desejamos. Podemos perceber quais são os problemas e o que necessitamos para resolvê-los. Podemos tomar pequenas decisões e grandes decisões. Podemos sentir-nos frustrados quando tentamos tomar decisões ou resolver problemas, mas isso é normal. Às vezes, precisamos ficar frustrados para penetrar em nosso próprio pensamento. Tudo isso faz parte do processo.
Lembre-se de que as decisões não têm de ser feitas com perfeição. Não temos de ser perfeitos. Não temos nem mesmo de ser quase perfeitos. Podemos apenas ser quem somos. Podemos cometer erros em nossas escolhas. Não somos tão frágeis a ponto de não podermos cometer um erro.
Grande coisa! Isso faz parte da vida. Podemos aprender pelos nossos erros ou podemos simplesmente tomar outra decisão. O parágrafo seguinte discute a decisão no mundo corporativo, mas acredito que isso também se aplica a outras áreas da vida. “Se tomar uma decisão, você se tornará um herói na cultura da corporação. Se trinta por cento de suas decisões estiverem certas, você vai ser um vencedor.”2
Podemos até mudar de ideia. Depois, mudar de novo. E de novo. Os codependentes vacilam.3 Como codependentes, estamos no meio de situações perturbadoras. Podemos ir para a frente e para trás um bocado; podemos descartar o alcoólico, depois aceitá-lo de volta. Podemos ir embora e depois voltar, e depois ir de novo. É assim que chegamos aonde estamos indo. Tudo bem. Vamos dar mais um passo – é normal e quase sempre necessário.
“Mas”, pode objetar um codependente, “você não conhece minha cabeça. Às vezes, penso coisas horríveis. Às vezes, tenho fantasias que não posso nem contar.” Todos nós temos, e isso é normal, principalmente se estamos vivendo com um alcoólico. Podemos ir ao enterro do cônjuge de um alcoólico cem vezes em nossa mente. Nossos pensamentos são a chave do que sentimos. Nossos sentimentos são a chave do que pensamos. Não temos de reprimir. Precisamos deixar os pensamentos e as emoções nos atravessarem, depois decidir o que precisamos fazer para cuidar de nós mesmos.
As seguintes sugestões podem ajudar-nos a ganhar confiança em nossa capacidade mental:
• Preparar a mente para um pouco de sossego. Desligue-se. Vamos ficar calmos. Se estamos enfrentando uma decisão, grande ou pequena, primeiro nos acalmemos, depois decidiremos. Esperemos até que nossa mente esteja clara. Se não conseguirmos de jeito nenhum tomar uma decisão num determinado dia, obviamente não é hora de tomá-la. Quando for a hora, seremos capazes de fazer isso. E bem.
• Pedir a Deus que nos ajude a pensar. Toda manhã eu peço a Ele para me dar o pensamento certo, a palavra certa ou a ação certa. Peço a Ele para enviar-me Sua inspiração e orientação. Peço a Ele para ajudar-me a resolver meus problemas.4 Acredito que Ele ajuda. Sei que Ele ajuda. Mas Ele espera que eu faça a minha parte e pense. Alguns dias correm melhor do que outros.
• Parar de abusar de nossa mente. Preocupação e obsessão constituem abuso mental. Paremos de fazer isso.
• Alimentar nossa mente. Vamos dar informações à nossa mente. Vamos conseguir as informações de que necessitamos sobre problemas e decisões, sejam esses problemas distúrbios alimentares, alcoolismo, relacionamentos ou saber comprar um computador. Vamos dar à nossa mente uma quantidade razoável de dados, depois vamos deixá-la analisá-los. Encontraremos boas respostas e soluções.
• Alimentar nossa mente com pensamentos saudáveis. Façamos atividades que levantem nossos pensamentos e nos deem uma carga positiva. Vamos ler um livro de meditação todas as manhãs. Encontremos algo que nos faça dizer “eu posso”, em vez de “não consigo”.
• Ampliar nossa mente. Muitos de nós ficamos tão preocupados com nossos problemas e de outras pessoas que paramos de ler jornais, ver documentários, ler livros e aprender coisas novas. Vamos nos interessar pelo mundo à nossa volta. Vamos aprender algo novo. Fazer um curso.
• Parar de dizer coisas más sobre nossa mente. Vamos parar de dizer a nós mesmos coisas como: “Sou um idiota”, “Não consigo tomar decisões”, “Não sou muito inteligente”, “Nunca fui bom em analisar as coisas”, ou “Não sou muito bom para tomar decisões.” Dizer coisas boas sobre nós mesmos é tão fácil quanto dizer coisas negativas. E provavelmente começaremos a acreditar nas coisas positivas e descobriremos que elas são verdadeiras. Isso não é excitante?
• Usar nossa mente. Tomemos decisões. Vamos dar opiniões. Expressá-las. Vamos ser criativos! Pensemos nas coisas, mas não fiquemos preocupados ou obcecados. Não temos de deixar que ninguém tome nossas decisões por nós, a menos que estejamos sob tutela. E mesmo se estejamos, ainda assim podemos pensar e fazer nossas escolhas. Deixar que os outros tomem decisões por nós significa que estamos sendo cuidados, o que quer dizer que nos sentimos vítimas. Não somos vítimas. Além disso, não é nosso dever tomar decisões por outros adultos. Podemos tomar posse de nosso poder de pensar. E podemos deixar que os outros sejam responsáveis por seus pensamentos. Ganhamos mais confiança em nós mesmos à medida que começamos a nos sentir melhor e a tomar decisões, pequenas e grandes. As pessoas à nossa volta crescerão à medida que lhes for permitido fazer escolhas e cometer erros.
Podemos viver confortavelmente com nossa mente. Tornemo-nos íntimos dela. Ela é parte de nós, e ela funciona. Confiemos nela e em nossa capacidade de pensar.
ATIVIDADE
- Quem toma suas decisões por você? Como se sente sobre isso?
- Alguém importante em sua vida disse que você não sabia pensar e tomar boas decisões? Quem?
- Comece fazendo uma coisa a cada dia para melhorar sua mente: leia um artigo no jornal e formule uma opinião. Mais tarde poderá realmente querer arriscar e dizer a alguém sua opinião sobre aquele assunto. Poderá até acabar participando de um animado debate.
Do livro: Codependência Nunca Mais, Pare de Controlar os Outros e Cuide de Você Mesmo, [recurso eletrônico] Melody Beattie, 5ª Edição, Viva Livros, 2017